Nenhuma agência entende de Agro (substitua pelo seu setor)

Recentemente, revisamos a abordagem da nossa agência nas prospecções a novos clientes. A tarefa foi: achar um gancho que refletisse a maior dor do contratante, para usar no primeiro contato. No setor de Agro, com o qual trabalho há mais de 20 anos, foi fácil definir.

A principal queixa dos CMOs e analistas de marketing é de que nenhuma agência entende a realidade, as rotinas, a linguagem do agronegócio. Se você trabalha nesse segmento (ou em qualquer negócio B2B de nicho técnico), já deve ter passado por essa dificuldade de encontrar fornecedor de comunicação especializada.

Quando essa falta de entendimento acontece, normalmente o motivo é um destes dois:

  1. Realmente a agência não tem um viés conteudista e é focada em comunicação promocional;
  2. A empresa não está disposta a conectar a área técnica com os conteudistas da agência, e o conhecimento não flui.

Agência sem viés conteudista

O primeiro caso de fato não é incomum. Só no marketing digital, há dezenas de serviços especializados. Cada agência tem sua característica e especialidade. Algumas têm um viés promocional e B2C. Pegue, por exemplo uma empresa que nasceu, se desenvolveu e se acostumou a trabalhar com empresas de varejo, com foco promocional. É muita peça direta, com CTA certeiro e objetivo, sobre produtos que todo redator conhece ou usa no dia a dia. O time nesta agência recém saiu da Black Friday e já está na avançado nas promos de Natal. E é mega ágil e eficiente nisso.

Em alguns segmentos, conhecimento aprofundado sobre o negócio é dispensável para a realização de um trabalho eficiente. Bons redatores publicitários dão conta tranquilamente de uma entrega efetiva, dependendo do assunto. Além disso, tem um sem-número de agência altamente competentes em suas áreas e especialidades (performance, mídia externa, trademarketing) que entregam excelentes trabalhos, mas não devem ser cobradas por conteúdo exemplar. Que, por exemplo, não contam com jornalistas na equipe.

Por que isso é importante? O bom jornalista tem essa habilidade de compreender e mastigar diferentes assuntos. Um jornalista experiente pode produzir conteúdo sobre música, setor elétrico, câncer, crimes, futebol, startups, e, claro, agro, incluindo temas tão específicos quanto mercado de sêmen, cadeia produtiva da cana, ferrugem asiática, impacto do mercado de petróleo no preço do milho.

O segredo? É o processo: pesquisar e perguntar, perguntar, perguntar para suas fontes. Não ter vergonha de pedir explicações sobre as questões mais básicas, sobre cada termo técnico. Não ter medo de ligar para outros especialistas para buscar a explicação mais clara sobre cada assunto. E, claro, ir acumulando conhecimento a cada novo trabalho. Assim funciona em uma redação. Assim deve funcionar nas agências de conteúdo ou nas com viés conteudista.

Empresa sem cultura de compartilhar conhecimento

Um tempo de aclimatação entre a linguagem e a cultura de uma empresa e a equipe da agência que começa a atendê-la é normal. Três, quatro meses em que parece que as coisas não vão fluir. Até que fluem… Mas, para isso ocorrer, é preciso que a empresa esteja disposta a compartilhar o conhecimento com seus fornecedores.

Nossa agência já atendeu um cliente da área de certificações da cadeia do agro com temáticas extremamente complexas – normas técnicas, legislações internacionais, mercado agrícola internacional, protocolos de produção – em que não faltou à equipe suporte dos técnicos, do diretor da empresa, do pessoal comercial. Nestes casos, qualquer falha de conteúdo pode ser colocada na conta da agência; e agência alguma pode reclamar que “não funcionou porque o negócio era muito complicado”.

Em contrapartida, já atendemos uma empresa de suplementos alimentares em que não houve imersão, nem visita técnica inicial à planta industrial; em que todo o contato, salvo raras exceções, era com o Departamento de Marketing. Os redatores precisavam vasculhar raras notícias na Internet sobre o tema e ainda catar herméticos artigos acadêmicos das áreas de Química, Medicina, Biologia, Nutrição… Ou seja, encontrar referências científicas e autores sem suporte técnico algum do contratante.

Adivinhe? Não funcionou! E nem tinha como…

Canal aberto

Defendo sempre que, em clientes de temática complexa, o redator, seja ele de social media, conteúdo publicitário, publieditorial ou editorial, tenha acesso direto aos técnicos da empresa atendida. No máximo, notifique o atendimento da agência e o gerente do projeto no Marketing do contratante sobre os contatos. Isso é raro no marcado publicitário, relativamente raro em comunicação corporativa e relativamente comum nos contratos de conteúdo editorial. Mas deveria ser praxe.

Para que ocorra, o contratante precisa ter confiança na agência. E lembrar que os contratos normalmente trazem seus rígidos termos de confidencialidade, com os quais as agências costumam ser tão rigorosas quanto a equipe interna. Quando o acesso dos conteudistas aos técnicos e decisores da empresa é fluido, ganham todos. Os erros sempre podem ocorrer, mas, nesses casos, são percebidos muito antes de o conteúdo ir para a rua, porque quem entende das questões técnicas fica também mais comprometido com revisão, conteúdo e resultados.

Antes de encerrar essa conversa, necessário dizer que você não precisa pesquisar nossa base de clientes para saber qual empresa deu e qual não deu acesso a seus técnicos (o que, aliás, eu faria, curioso que sou…). Alterei propositalmente os segmentos, porque odeio diretas ou indiretas online, mas acho que as histórias valem para ilustrar como é um trabalho que flui e outro que não flui.

O importante aqui é a reflexão.

A sua empresa tem a cultura de partilhar informações com os fornecedores de comunicação e conteúdo? De realizar uma imersão inicial das agências no negócio? De facilitar acesso direto da agência aos técnicos, e não restringir somente à equipe de comunicação e marketing?

Se a resposta é sim, você de fato pode reclamar que sua agência não entende do seu setor ou seu negócio. Se a resposta for não, resolver isso provavelmente está na sua mão.

 

Sebastião Ribeiro, Sócio-fundador da Cartola e Amanita